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A democracia não é um regime político natural. O natural nas sociedades humanas, mesmo quando integradas em Estados, é a dominação de uma parte do povo por outra. Normalmente, é uma minoria a tomar o poder e a submeter a maioria ao seu jugo.

A democracia tal como a entendemos hoje, baseada na igualdade de todos os cidadãos perante a lei, no respeito pelos direitos fundamentais de cada um deles e, depois, na vontade da maioria,  é uma conquista civilizacional relativamente recente.

Para chegar até aqui foi preciso passar por muitas fases, constituindo a mais próxima no tempo e no espaço europeus a superação da divisão da sociedade em classes (nobreza, clero e povo), cabendo às duas primeiras, largamente minoritárias, o poder de mandar, tendo na cúpula um monarca  que se foi tornando cada vez mais poderoso, ao ponto de estabelecer um regime absoluto.

A Revolução francesa trouxe uma modificação profunda com a abolição dos privilégios da nobreza e do clero, a introdução do voto por cabeça e não por classes, o acolhimento da separação dos poderes e a publicação da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Mas foi preciso ainda percorrer muito caminho para estender o sufrágio a todos os homens (e não apenas aqueles possuidores de mais meios de fortuna) e às mulheres, tendo hoje direito de voto todos os cidadãos que chegam a maioridade.

A democracia está em constante aperfeiçoamento, pois não se basta com eleições livres e periódicas, precisando de concretizar os direitos fundamentais da pessoa para alcançar uma vida digna o que implica não só a liberdade de pensamento e opinião, mas também nomeadamente  o acesso à educação, à saúde, à justiça e à habitação condigna.

Isso implica uma cada vez maior igualdade entre os cidadãos, pois concentrando-se a riqueza nas mãos de alguns, outros ficam pobres e sem acesso aos direitos fundamentais. O combate às desigualdades é uma exigência permanente da democracia.

A democracia pode adoecer e morrer pela não concretização dos direitos fundamentais das pessoas e pela descrença no valor da dignidade da pessoa. Pode morrer também pela difusão da ideia de que o poder pertence a quem dele se apodera e não ao povo, constituído pelos  cidadãos e cidadãs.

A democracia só se mantem com democratas. O democrata é aquele que respeita o outro na sua liberdade e o considera um seu igual. O grande problema dos nossos dias é que alguns se julgam superiores aos outros e os querem dominar, impondo as suas ideias, à força, se necessário. Para estes, as eleições livres são apenas um instrumento, para uma vez alcançado o poder, acabar com elas ou  fazer um arremedo de eleições  e destruir os pilares da democracia.

Há muito caminho a andar para educar para a democracia e esse caminho deve começar na família, na escola e continuar na vida adulta.

Que bela escola são, por outro lado, os documentos que constituem o ensino actual da Igreja neste domínio!

António Cândido de Oliveira

(Publicado no DM de 15.2.24)