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 Nos termos do n.º 1 do artigo 76.º do Regime Financeiro das Autarquias Locais e das Entidades Intermunicipais (RFALEI)*, os documentos de prestação de contas das autarquias locais são apreciados pelos seus órgãos deliberativos, reunidos em sessão ordinária durante o mês de abril do ano seguinte àquele a que respeitam, sendo esta uma disposição que surge alinhada com o disposto no Regime Jurídico das Autarquias Locais (RJAL) **, particularmente no n.º 2 do seu artigo 11.º (assembleia de freguesia) e no n.º 2 do artigo 27.º (assembleia municipal). Não resultando previsto um específico prazo para o efeito, caberá aos órgãos executivos das autarquias locais elaborar e aprovar os documentos de prestação de contas (al. e) do n.º 1 do artigo 16.º e al. i) do n.º 1 do artigo 33.º do RJAL) para que os mesmos sejam submetidos pelos respetivos presidentes aos órgãos deliberativos (al. k) n.º 1 do artigo 18.º e al. j) do n.º 1 do artigo 35.º do RJAL) com a antecedência necessária à sua tempestiva aprovação na sessão ordinária durante o mês de abril. 

Todavia, o n.º 2 do artigo 132.º da LOE21***, “considerando os atrasos na implementação do novo sistema contabilístico”, veio estabelecer uma prorrogação daquele prazo, ao determinar que “na administração local, a prestação de contas relativa ao exercício de 2020 pode ser efetuada até 31 de maio de 2021”. Esta data passou, por isso, a constituir o limite temporal para a aprovação das contas pelos órgãos deliberativos – exigindo-se, em consequência, aos órgãos executivos a preparação e elaboração dos documentos de prestação de contas com a antecedência necessária para que a sua aprovação pudesse ter lugar até àquele momento. 

Apesar da prorrogação de prazo de que a prestação de contas pelas autarquias locais havia beneficiado ao abrigo da LOE21, em consideração à atual conjuntura pandémica, decidiu o legislador promover nova dilação do prazo de prestação de contas. Assim, por via da Lei n.º 13- B/2021, de 5 de abril, alterou o n.º 7 do artigo 3.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, o qual passou a prever que: “para efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 132.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2021, a prestação de contas nas reuniões ordinárias dos órgãos deliberativos das autarquias locais previstas para o mês de abril pode realizar-se até ao dia 30 de junho de 2021”. 

Tomando em consideração as disposições normativas citadas, em abril de 2021, a DGAL emitiu uma “Nota Informativa Prestação de contas de 2020 na Administração Local”, concluindo – ao que aqui interessa – que: (i) a aprovação das contas, por parte do órgão executivo, poderá ocorrer até 31 de maio; e (ii) a apreciação e votação das contas, por parte do órgão deliberativo, poderá ocorrer até 30 de junho. No essencial, considera a DGAL que a prorrogação até ao dia 30 de junho, estabelecida por via da alteração da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril, ocorreu apenas relativamente às competências dos órgãos deliberativos, mantendo-se em vigor o limite constante do n.º 2 do artigo 132.º da LOE21 (31 de maio) para a atuação dos órgãos executivos. 

Pese embora se reconheça que a expressa referência às “reuniões ordinárias dos órgãos deliberativos” acabe por constituir um elemento perturbador do exercício hermenêutico, a interpretação proposta pela DGAL quanto à imposição de um prazo para a atuação dos órgãos executivos, na nossa perspetiva, não deverá prevalecer, pela seguinte ordem de razões: 
i) Em termos gerais, a lei disciplina apenas o limite temporal à aprovação das contas pelos órgãos deliberativos, determinando (implicitamente) que os órgãos executivos deverão diligenciar pela preparação, elaboração e submissão dos documentos àqueles órgãos com a antecedência necessária para que o prazo de prestação de contas seja cumprido; 
ii) O prazo de 31 de maio previsto n.º 2 do artigo 132.º da LOE21 nunca constituiu um limite à atuação dos órgãos executivos, uma vez que – ao abrigo da norma citada – para que os órgãos deliberativos pudessem exercer a sua competência até àquela data, exigia-se que os documentos de prestação de contas lhe tivessem sido submetidos com a necessária antecedência; 
iii) Não será de admitir que – até à aprovação da Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril – tenha o legislador pretendido que os órgãos executivos exercessem a sua competência até 31 de maio, quando os órgãos deliberativos se encontravam vinculados a exercer a sua no mês de abril; 
iv) A referência às “reuniões ordinárias dos órgãos deliberativos das autarquias locais previstas para o mês de abril”, constante do n.º 3 do artigo 7.º da Lei n.º 1- A/2020, de 19 de março, resulta (apenas) do facto de o supramencionado n.º 1 do artigo 76.º do RFALEI, estabelecer que – em condições de “normalidade” – será naquela sessão que o órgão deliberativo deverá aprovar as contas da autarquia; 
v) Não se identifica nas disposições citadas uma regulação expressa e específica da atuação dos órgãos executivos; 
vi) Também não se identifica um interesse específico que pudesse o legislador pretender salvaguardar através do condicionamento temporal da atuação dos órgãos executivos, desde que a preparação, elaboração e submissão dos elementos de prestação de contas sejam concretizadas com a antecedência adequada à sua apreciação pelo órgão deliberativo; 
vii) A existir o referido interesse, certamente seria acautelado no “regime geral” resultante do n.º 1 do artigo 76.º do RFALEI, o que não acontece; 
viii) Não são vislumbráveis razões que sustentem o entendimento de que o legislador tenha pretendido, por via das normas especiais e excecionais em causa, alterar o “regime geral”, para além da prorrogação do prazo de aprovação das contas pelos órgãos deliberativos. 
ix) Tal como não são vislumbráveis razões que sustentem o entendimento de que em 2021, por referência à prestação de contas de 2020, tenha o legislador pretendido estabelecer um regime distinto daquele que vigorou em 2020, por referência à prestação de contas de 2019****. 

Conclui-se, pelo exposto, que: 
a elaboração, aprovação e submissão dos documentos de prestação de contas pelos órgãos executivos das autarquias locais não se encontra temporalmente limitada pelo prazo de 31 de maio; 
todavia, esta competência deve ser exercida com antecedência necessária para que a apreciação e votação das contas pelos órgãos deliberativos ocorra até 30 de junho de 2021. 

* Aprovado pela Lei n.º 73/2013, de 12 de setembro. 
** Aprovado pela Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro. 
*** Lei do Orçamento do Estado para 2021, aprovada pela Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro. 
**** Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 3.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na sua redação original.